quinta-feira, outubro 24, 2013

quarta-feira, outubro 23, 2013

Futuros versos

O agora não é mais antes
Para ontem não tem agenda
Quem conseguiu mudar o passado
Ou lá ficou
Ou virou lenda

sábado, outubro 19, 2013

Movimentos de consciência


"Que o mundo é meu mundo revela-se no fato de os limites da linguagem (da linguagem que apenas eu compreendo) significarem os limites do meu mundo."
Ludwig Wittgenstein


"A felicidade não é a recompensa da virtude, é a própria virtude. Também não sentimos prazer com a felicidade porque restringimos nossas luxúrias. Pelo contrário. Por sentirmos prazer em nossa felicidade, por isso mesmo somos capazes de restringi-los."
Baruch Spinoza

A consciência é um convite para a realidade. Permeada pelo subconsciente, dentro de um também conhecido inconsciente coletivo, cabe à consciência discernir das diversas impressões dos sentidos o que é falso e o que é ilusório.

Por mais booleana que essa lógica de verdadeiro e falso possa parecer, a realidade é mais do que zeros e uns. Mas a mente não consegue conceber mais do que dois opostos em grande maioria dos casos. A armadilha do bem e do mal, do justo e do injusto, tem provocado na consciência de alguns o preconceito, a intolerância e o erro. O caminho ideal é o caminho do meio, mas qual é o meio termo entre o bem e o mal? Existe mal que faz o bem, e existe bem que faz o mal. 

Recorro à uma parábola hebraica sobre o homem justo que havia morrido. O homem justo, sabemos, não é merecedor da morte para os seus familiares. Sempre pensam: eram tão bom! Por que morreu? Um dia, em um velório, perguntaram a um rabino se Deus era mesmo justo. Afinal porque levar tão jovem um homem bom, que fazia o bem, se havia homens injustos ainda vidos que Deus não levava à morte. Ao que o rabino, bravo, sério, respondeu: "Desconheces os planos do Senhor. Não sabes se o filho de um homem iníquo poderá vir a ser o mais justo entre os justos. Desconheces se todas as atitudes malignas de alguns homens não acabem terminando com o bem para todos. Não sabes se o homem justo que aqui deixou esta vida não terá a missão de levar à justiça como mensagem ao povo. Os planos de Deus são irreconhecíveis."

E assim, aquele rabino, tão versado na filosofia hebraica da Kabbalah, havia colocado um grande exemplo de um mal -- a morte de um justo -- que pode significa um bem, um símbolo de justiça para o futuro. E a sobrevivência de uma pessoa injusta -- um mal -- pode vir a ser um bem na geração de filhos justos. Os planos de Deus são mesmo um enigma para o ser humano, incapaz de conceber de fato espaços de tempo maiores do que uma vida humana. O tempo para nós é um enigma. Não sabemos o futuro, não mudamos o passado, mas podemos construir no presente e muita gente se esquece de que possui liberdade para decidir o que bem entender.

Movimentos de consciência requerem um choque, um trauma, um erro para o devido aprendizado. Não haveria tanto apelo para democracia se não fosse algo provado, pela própria democracia, que a tirania pressiona os povos e leva a grandes tragédias. E certamente essa dicotomia entre autoritarismo e liberdade chega a ponto de alguns absurdos que podemos retratar como manipulação da consciência.

Tomemos como exemplo países que censuram a internet. Ora, esses países não permitem que, em seus mecanismos de buscas nacionalizado, sejam feitas buscas por termos como "liberdade", "democracia" e  "sindicalismo" ou outros termos. Por quê? Porque a inexistência de conteúdo sobre esses temas leva à população à total inconsciência do que eles são. Aí concordamos com Wittgenstein, pois uma mente sabidamente livre, curiosa e disposta pode descobrir coisas fantásticas.

Na realidade, após um período de trevas de uma idade média autoritária na Europa, a democracia começa a florescer em países como Inglaterra e França diante de revoluções populares. Revoluções estas convocadas por homens livres, sabedores de que possuíam capacidade para gerir uma república. No entanto incorreram no erro de substituir uma tirania por outra. Isso ocorre porque a consciência da democracia era ilusória antes disso, pois só havíamos experimentado uma democracia interessante em Atenas, há muito tempo atrás. O que vimos muito na história foram autoritarismos contínuos, tiranias por séculos e ainda vemos. O poder ao povo é exceção, e não a regra. Mas a liberdade, para quem vive sob regime democrático, é estratégica para que a consciência seja ampliada.

Quando vemos situações como manifestações na primavera árabe, nas ruas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Mumbai e em outras partes do mundo, estamos assistindo a um movimento de consciência. Fruto de buscas pela liberdade a partir do conhecimento. Fruto da facilidade de acesso que a Internet vem possibilitando ao mundo. Os países com governos tiranos que deixaram a internet em aberto para a população estão vendo o que está acontecendo nesse momento.

Em nosso país, o Brasil, isso não é diferente. A realidade da internet sendo acessada pela população está provocando mudanças. A primeira mudança chocante é na busca por informações. A informação não é mais oligopólio da imprensa e do governo. Agora ela pode ser distribuída por todos e para todos em tempo real. Isso permite que as pessoas façam novos julgamentos sobre como agir e como pensar. Gera manifestações em tempo real, em que as pessoas são convocadas por cantos nas ruas e por mensagens em redes sociais. Ninguém se organiza mais por meio de noticiosos da imprensa, cada vez mais desprezada pela população que não concorda com as linhas editoriais deste ou daquele jornal.

Isso não é por acaso. Peguemos a palavra informação. Podemos quebrá-la pelo prefixo "in", que quer dizer "interior, interno" nesse caso e "formação", que quer dizer "dar forma a um objeto". Portanto informação quer dizer "aquilo que dá forma ao que há dentro de nós", ou seja, à nossa consciência. Daí partimos para a "trans-formação".  "Trans" tem a ver com trânsito, com movimento, com mudança de posição de um objeto.

A partir de internalização do conhecimento, do informar-se, é permitido o movimento da consciência, o transformar-se. Com mais pessoas sendo informadas sobre os mais diversos assuntos, é natural que transformações ocorram e que novas necessidades apareçam. Em termos de governos democráticos representativos, por exemplo, ao meu ver a tendência é de uma democracia mais direta e eletrônica. Já para governos tiranos, a tendência é uma transformação para democracias representativas. Com isso a sociedade tende a transferir o poder de decisão para o voto em vez de para o cabresto, ou a bala.

O medo da transformação é o que nos leva a não aceitar a informação. Pense nisso no caso da informação sobre o aquecimento global. Há quem diga que esse assunto é balela. Não obstante, o ritmo de movimentos extremos de temperatura e tragédias globais vem crescendo, e novos relatórios cada vez mais mostram que a atividade humana impulsiona o aquecimento e que há riscos para a humanidade. Portanto precisamos transformar nossos carros, fábricas e modos de vida para a utilização de energia de forma sustentável. Naturalmente isso não é simples. E quem tem medo da transformação naturalmente irá dizer que isso não é necessário. E irá negar a informação, a ponto de entidades industriais pagarem institutos de pesquisa para criar uma pesquisa que prove o contrário. Assim se evita a transformação por meio da desinformação.

Na realidade estamos todos nós em formação. O indivíduo, membro da sociedade, precisa mesmo aprimorar-se para ver a sua sociedade ao redor se aprimorar. E esse estímulo ao próximo para que ambos progridam, o que chamamos de solidariedade, é algo que vem diminuindo na medida em que o indivíduo acredita no individualismo como método de alavancagem social. O que ocorre é que essa alavancagem por recursos materiais também não é sustentável e, cada vez mais, as pessoas mais individualistas tornam-se menos solidárias, levando à destruição das comunidades.

A quem isso interessa? Aos que já estão no poder e querem perpetuar-se. Portanto cabe ao cidadão comum a decisão de engajar-se mais na política de seus países, nas informações disponíveis e no compartilhamento de ideias e recursos. Na medida em que a sociedade se organiza a partir dos indivíduos para executar um trabalho de transformação, há aí um movimento de consciência. Trinta anos atrás era impossível imaginar que as pessoas iriam invadir um centro de pesquisas para tirar animais que são utilizados para testes com cosméticos. No entanto é isso o que estamos vendo hoje. Esse movimento de consciência, de proteção ao animal que nem é da nossa espécie, é um tipo de amor que não víamos nem dez anos atrás. Mas há uma consciência sempre em movimento que leva em consideração novas informações, levando-nos a melhores decisões sobre a vida.

Pegue uma caneta e papel e escreva o seu livro. Faça isso com a sua consciência. Conheça a sua consciência como você conhece a pessoa amada, ou mais. Com isso, você terá condições de saber em que se aprimorar. Utilize os recursos disponíveis como a internet, o Google, Wikipedia e o que mais houver. Lembre-se de que nem tudo é confiável, portanto, não acredite em tudo. Ambiente-se sobre as movimentações políticas, manifestações e pense até mesmo na atuação política. Não se restrinja ao voto. Cobre o seu político durante todo o mandato e procure entender como está a situação partidária do seu político no poder. E não seja ignorante. Não desperdice o seu voto com promessas vazias. Use a sua consciência em movimento. Com isso, moveremos a consciência de toda a sociedade, levando a decisões melhores.

Em poucas palavras: movimente-se.

quarta-feira, outubro 16, 2013

Amaro

Amaro tempo
encerra a vida
e o movimento

Amara emoção
você não diz sim
ela não diz não

Amaro sonho
realidade é o seu
abandono

Amara vida
entre vida e morte
a ferida

Amaro desespero
a cada nova pergunta
um destempero

Amara loucura
estado da arte
que cura

terça-feira, outubro 01, 2013

Filosofia - A escolha de Salomão

Ocupar-se é estar em estado de movimento, impossibilitado, portanto, de ponderar. Agir é mover, provocar mudança em algo, nem que seja em sua posição. Se você move, você cria. Não importa se é só os dedos e o cérebro. Ao escrever, dificilmente se aprende. O escriba que acompanhava a reunião de Platão com os filósofos gregos e escrevia tudo o que acontecia nas aulas de Sócrates dificilmente aprendia alguma coisa naquele momento. O trabalho de escrever o que acontecia era difícil, o processo era lento. Era um negócio. E desse trabalho, naturalmente, surgiram muitas questões que hoje se colocam na vida das pessoas, ainda que de forma velada ou indistinta. A filosofia, na verdade, é a arte liberal em essência. No entanto é diferente das outras artes e ciências liberais, todas associadas ao movimento. A filosofia está associada única e simplesmente à mente e às inúmeras sensações, experiências e ponderações que ela possui.

A raiz disso está na palavra "Sofia". Reconhecida como "sabedoria", Sofia era para os hebreus Chochmah, e significava algo extremamente sagrado. Chochmah era reconhecida como uma Sephirot no que os antigos estudantes da cabalá definiam como uma dimensão do universo, um fruto da chamada Árvore da Vida, ou Etz Chaim. Esta árvore teria também outros frutos como Binah, a inteligência, Netzach, a Misericórdia e D'aat, um fruto escondido, o Conhecimento. Algo de que voltaremos a falar posteriormente.

A sabedoria, assim como a inteligência, eram os únicos caminhos possíveis que poderiam levar à Kether, que seria a coroa, o topo da árvore, a inteligência suprema. Por isso que Salomão, em seus muitos sacrifícios de animais, em cerimônias de magia cerimonial, teria, um belo dia, tido contato com o Senhor e, nesse dia, o Senhor teria dito que Salomão era justo e que, por isso, poderia pedir o que quisesse. Salomão poderia pedir poder, riqueza, temor dos inimigos, o que quisesse. Mas Salomão, conhecedor dos caminhos divinos, dos ramos da Árvore da Vida, escolhe a Sabedoria. Pois, por meio dela, seria capaz de atingir o domínio da própria vida, seria verdadeiramente livre e, com isso, capaz de agir em meio à sociedade que liderava, o povo judeu. E com isso também conseguiria construir o Templo de Salomão, um lugar divino voltado ao estudo de si mesmo, ao estudo da Sabedoria, a mesma Sabedoria que Salomão pedira ao Divino em suas orações.

Esse caso mostra a importância da filosofia. Ora que philos, em grego, é uma forma de amor, também conhecida por amizade. E a amizade tem muitos nomes, como apreciação, afeto, reconhecimento e outros. Ter um amigo é ter alguém em quem confiar. E o que a filosofia ensina, portanto, é que temos que confiar na sabedoria como resposta às nossas inquisições da alma. Os gregos sabiam disso, em grande parte, por causa de sua religião. A religião grega é baseada em elementos de nossa própria psicologia. Os deuses tinham vida como a nossa, cheia de traições, paixões, medos, angústias e tragédias. Por isso os gregos vieram a desenvolver a filosofia. Já em seu tempo, a filosofia era uma resposta diferente a da religião, porque os filósofos se ocupavam em entender os processos mentais, os sentimentos, as sensações, a matéria, o tempo e o espaço. E todas essas coisas complexas para a filosofia tinham respostas simples na religião que, afinal, não satisfaziam os filósofos. Era preciso pensar em algo a mais que pudesse corresponder aos anseios da humanidade. Por isso confiar na sabedoria foi algo inteligente para a humanidade. A partir dessa disciplina várias outras foram criadas. Os grandes filósofos eram também matemáticos, psicólogos, estudantes da religião, físicos, químicos, engenheiros, arquitetos e, naturalmente, os poderosos, que sempre souberam afinal o que tinha valor nessa vida -- por isso mantiveram e mantêm o poder os que buscam por meio de sabedoria ou inteligência o seu domínio e a liberdade.

Filósofos estoicos como Sêneca e Epiceto diziam que apenas uma pessoa sábia é verdadeiramente livre. Na verdade a pessoas sábia é aquela que saboreia a vida. No português, como em outros idiomas, a palavra Sabedoria vem de sappere, do latim, saborear. No português, o verbo saber é sinônimo de saborear, assim como no espanhol. Portanto os que não provam o amargo não podem saber o que é, não têm a experiência necessária. Portanto é necessário experimentar em nossas vidas para que ela seja plena e para que saibamos o que fazer diante das dificuldades. Pois de nada adianta filosofarmos sobre tudo sem a certeza do que pode vir a acontecer.

No mundo moderno, diante de problemas como a adicção em drogas, por exemplo, a filosofia teria muito a falar. Nos grupos de apoio, uma das coisas que ocorre é o compartilhamento de histórias pessoais, que levam as pessoas a entender onde podem chegar diante dessas situações. Isso é uma troca de informações que levam à sabedoria. Ao saber onde se pode chegar por um vício, pode-se evitar trilhar uma estrada a partir da experiência alheia. Portanto devemos aprender com todos a todo momento.

Mas mais do que com todos, filosofia consiste em aprender com o passado. O passado que nos chega por meio de documentos, livros, textos, músicas e ideias pode nos levar a experimentar novas sensações e a conhecer novas histórias que complementem e ajudem a tomar decisões melhores. Se você conhece Hamlet sabe que se trata de uma tragédia em que muitos morrem. E pode pensar que agir como Hamlet é perigoso e evitará similar tragédia. Não por acaso, as manifestações da arte teatral nasceram da catarse religiosa, da necessidade de se representar antigas lendas para que as pessoas visualizassem como aquilo poderia ter acontecido. A partir desta visualizações, a aprendizagem ocorreria com maior facilidade. Haveria, portanto, um maior entendimento sobre as coisas. A arte é, portanto, uma forma de fazer ocorrer a filosofia.

Os mistérios do nosso subconsciente ainda são um enigma, mas um subconsciente fortalecido de sabedoria pode tomar decisões mais interessantes além de fortalecer a mente de influências externas diretas ao nosso subconsciente. Deveríamos ser mais capazes de perceber as intenções de manipular os nossos sentimentos em noticiários e campanhas publicitárias, evitando, assim a falta de liberdade de agir diante dos impulsos artificialmente criados no subconsciente. A filosofia é resposta e caminho para a liberdade. É uma arte ou ciência libertadora e, diante disso, ficamos estarrecidos com o que somos capazes de acreditar cegamente sem compreender os mecanismos de manipulação de nossas mentes. Portanto é fácil concordar com os estoicos: hoje, mais do que nunca, apenas os sábios podem ser livres para escolher o que é melhor para cada um. E a humanidade, cada vez mais ignorante, caminha na direção contrária da estrada da Sabedoria. Aprimora-se em inteligência em alguns lugares, mas no geral a Sabedoria que deveria governar todas as mentes é ignorada.

Um dos caminhos possíveis para se alcançar a Sabedoria é o Conhecimento. Outro ainda é a Beleza, ou seja, a contemplação da beleza de viver, estágio alcançado por meio da meditação ou da oração. Outro caminho possível é por meio da inteligência, do estudo, do trabalho ativo, da força de vontade. E existe um caminho, o caminho cristão por excelência, que é o caminho da Misericórdia, ou seja, da compaixão, do colocar-se no lugar do outro, do experimentar a tristeza e a alegria alheia e, com isso, obter a sabedoria. Todos os caminhos são viáveis, mas nem todos levam de fato à Sabedoria. Sabedoria é calar-se enquanto o mundo fala palavras desconexas e tentar tirar desse ruído algum sentido. Sabedoria é a justiça e a verdade universal. E sabedoria é também o caminho para o Conhecimento real de nós mesmos. Sobretudo diante de problemas universais.

A escolha de nossas vidas, portanto, deve ser como a escolha de Salomão: a Sabedoria. Ela é capaz de nos guiar para uma melhor viagem e, com isso, levar-nos à liberdade de agir, ou ao domínio de si mesmo. Filosofia, portanto, não é apenas o ócio do tempo de estudos, é, sobretudo, ativamente optar por caminhos mais sábios na vida do que por caminhos mais espinhosos. É uma tarefa excelente, sobremaneira, pois eleva o espírito e faz o homem livre conhecer a liberdade para exercer a sua verdadeira vontade por todo a brevitude de vida que possui.